



Caminho I
Tenho sonhos cruéis; n'alma doente
Sinto um vago receio prematuro.
Vou a medo na aresta do futuro,
Embebido em saudades do presente...
Saudades desta dor que em vão procuro
Do peito afugentar bem rudemente,
Devendo, ao desmaiar sobre o poente,
Cobrir-me o coração dum véu escuro!...
Porque a dor, esta falta d'harmonia,
Toda a luz desgrenhada que alumia
As almas doidamente, o céu d'agora,
Sem ela o coração é quase nada:
Um sol onde expirasse a madrugada,
Porque é só madrugada quando chora.
Camilo Pessanha
Lisboa,7 de Junho de 2009
A arte deve passar por ser reflexo do interior de cada um, tanto do artista como por quem vê a obra e a assume como arte. Por isso considero que se uma peça transmite algo a uma outra pessoa que não o próprio artista, então essa peça já obteve o resultado pretendido e que por isso não precisa de explicações. Assim como na matemática não precisamos de analisar a conta toda se no fim, depois do sinal (=) o resultado está certo.
Mas confirmemos se nesta conta o resultado está correcto, voltemos atrás e vamos rever os passos que nos levaram a esta resposta.
Valerá a pena descrever o invisível ou o visível ?
Perda ignóbil de tempo… pode-se procurar no dicionário um significado (invisível-adj.Que não se vê ou não pode ser visto.;visível -adj. 2 gén Que pode ser visto; Que não está interceptado! por coisa que no-lo oculte;Perceptível!.) mas será esta a resposta que procuramos?!
Estes termos tão vagos e sem resposta concreta são reflexo da minha própria condição actual, de falta de precisão. No meio da neblina onde nada é bem visível nem chega a ser invisível. Estou perdida!
Quando pintamos um quadro precisamos de nos afastar de quando a quando para vermos o quadro no seu todo, compreendermos onde devemos alterar algo, o que está bem e o que não está tão bem. Assim é também na vida real, ás vezes é preciso “afastarmo-nos” para se ver de fora as coisas, compreendermos certas situações, sentimentos e emoções.
Foi o “fugir” e o “voltar” que me trouxeram a esta encruzilhada, foi, também, esta viagem que me ensinou a sentir mais intimamente as coisas.
Neste projecto tento transmitir a sensação de invisibilidade que senti quando me encontrava “fugida”, senti que não era ninguém que era por e simplesmente INVISIVEL. Duas das peças que vou expor foram inspiradas em dois momentos que vivi em Paris, momentos esses que no meio de uma tremenda solidão em mim mesma me senti visível. Uma agitação por dentro de nós mesmos que não nos é indiferente e, que na maioria das vezes, é desprezado pelos outros que “estão ao nosso lado”. O que quero dizer com tudo isto é que não devemos desprezar o que não nos é visível ao primeiro olhar, é preciso dar mais tempo às coisas, por vezes é preciso reflectirmos e não deixarmos só um instante contar tudo.
Peço que dêem tempo as estas peças para que elas se revelem.
Margarida Salvador Lisboa